ECONOMIA VERDE
Governo do Estado
de Rondônia
Em 2020, as Reservas Extrativistas (Resex) do Rio Cautário e Rio Ouro
Preto, ambas em Rondônia, nesta parte da Amazônia Ocidental, produziram 20
toneladas de borracha. Em uma estimativa bem conservadora, o Estado pode
produzir tranquilamente 200 toneladas de borracha por ano, que proporcionariam
negócios no total de R$ 2,52 milhões.
A Secretaria Estadual de Desenvolvimento Ambiental (Sedam) vem
constatando essa realidade, durante visitas a algumas das sete comunidades da
Reserva Extrativista do Rio Cautário, na faixa de fronteira Brasil-Bolívia, em
Costa Marques.
Para o secretário da Sedam, Marcílio Lopes, a iminente retomada do
extrativismo nos seringais “vem consolidar estudos governamentais e a
disposição dos próprios seringueiros em se inserirem mais uma vez na economia
rondoniense”. “Isso não ocorre desde os tempos territoriais, quando muitos
seringais ainda estavam ativos”, mencionou.
Da mesma forma, a coordenadora de Florestas Plantadas (na Sedam), Julie
Messias e Silva e o coordenador de Unidades de Conservação, Fábio França,
acreditam no êxito da revitalização dos antigos seringais e nas Resex em geral.
Fábio iniciou visitas a todas as 40 UCs.
“Manter a floresta em pé garante a absorção do carbono que iria para
atmosfera; a floresta mantém o ciclo das chuvas de algumas regiões do Brasil,
notamos isso em nossa própria região”, assinalou Julie.
A coordenadora diz que a conservação de castanheiras e seringueiras em
franca produção “é essencial para Rondônia”, sob os pontos de vista ambiental e
econômico. “Além do que, elas contribuem para a manutenção das espécies de
plantas e animais (biodiversidade) e ocupam a atividade de comunidades
tradicionais que dela vivem e sobrevivem”.
Atualmente, o mercado convencional paga R$ 2,50 o quilo pelo CVP
(cernambi virgem prensado). Segundo o articulador institucional, Plácido
Costa, do Pacto das Águas (organização da sociedade civil de interesse público
– Oscip, que também trabalha com castanha, copaíba, óleos e outros produtos
florestais), isso acontece, quando os extrativistas estão organizados, emitindo
nota fiscal, tendo a declaração de acesso ao Programa Nacional da Agricutura
Familiar (Pronaf) e a outros documentos fundamentais para a presença no
mercado.
O guardião da floresta Raimundo Pereira Alves, 59 anos, já faz de tudo
para retomar a atividade com gosto. Chefe de uma das 15 famílias da
Comunidade Canindé, na Resex Rio Cautário, ele tem razão para se animar: a
produção vem melhorando e o preço também.
MELHORES PREÇOS
Segundo Plácido Costa, associações e cooperativas mais organizadas podem
acessar empresas de produtos de resistência a impactos e conseguir uma
subvenção de mais R$ 3,08 por quilo. Mas o Pacto das Águas vem obtendo para os
extrativistas um preço que passa de R$ 2,50 no mercado convencional, para R$ 8
a R$ 9 o quilo.
Para o engenheiro agrônomo e extensionista Celso Franco Damaceno, gestor
coordenador da Resex, o êxito do projeto do crédito de carbono será estratégico
na consolidação da retomada de antigos seringais. O crédito de carbono que impulsiona a
economia verde de baixas emissões de gases de efeito estufa (REDD+)* entrou nas
prioridades da pauta econômica do Governo de Rondônia.
“E havendo preço, esse mercado se tornará novamente atraente”, considera Celso, um dos fundadores da Organização dos Seringueiros de Rondônia.
Raimundo Pereira plantou um jardim de seringueiras de cultivo próximo às árvores nativas: “Para filhos e netos” |
Da mesma forma, o presidente do Conselho Deliberativo dos Recursos
Extrativistas Rio Cautário, Osvaldo Castro de Oliveira, acredita na tendência
dessa melhora, com subsídios da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) aos
extrativistas. E a qualificação entre extrativistas, empreendimentos
comunitários e sociedade se torna essencial para a construção de um campo de
relações na ótica da economia.
“Estamos tentando suplantar primeiro o elo com os atravessadores e
buscar empresas que tenham interesse em associar a sua imagem a causas socioambientais”,
destacou o articulador institucional do Pacto das Águas, Plácido Costa.
O setor ganha fôlego sob dois aspectos: a grande procura por látex entre
tradicionais empresas estrangeiras e o início do pagamento da bolsa de R$ 1 mil
mensais a famílias que sustentam a floresta em pé.
Mas há muito a fazer: “A revitalização dos seringais nativos e a
qualificação da produção, por exemplo, pois quase toda borracha em Rondônia é
cernambi virgem prensado, atualmente aproveitado por outras indústrias de
pneumáticos”, disse Costa.
MANTA BRANCA
“As indústrias de calçados escolares e outros estão precisando da manta
branca, e para obtê-la os seringueiros poderão utilizar tecnologias sociais em
suas colocações”, explicou o articulador.
Outro conceito importante hoje é o da bioeconomia, ele considera. “Além
da estruturação da cadeia de produtos da sociobiodiversidade e vários setores
da sociedade organizada, entende-se que as empresas precisam atuar com maior
responsabilidade socioambiental”, observou Costa.
“A atuação do Governo e da sociedade é no sentido da transição do
sistema de extrativismo e aviamento clássicos para planos de uso e manejo e
planos de negócios”, enfatizou.
O Pacto das Águas trabalha com uma empresa francesa, do ramo de
calçados. Há também tratativas com duas empresas de Novo Hamburgo (RS), uma
delas com sede fixa em Londres (Inglaterra), ambas exportadoras.
Antigos depósitos de borracha serão substituídos por novos barracões e
defumadores
De R$ 9, R$ 5,42 são pagos por uma empresa francesa, como reconhecimento
aos serviços ambientais prestados pelas comunidades extrativistas. Em
governança climática, o pagamento por esses serviços é uma medida que pode ser
muito eficaz para Rondônia. Ele viria através de um programa de preços mínimos
estaduais.
Parte dos R$ 200 milhões que venham ser proporcionados pelo mecanismo de
REDD + podem pagar serviços ambientais, como aponta o Pacto das Águas.
Plácido Costa mencionou o valor de R$ 30 milhões/ano, ou R$ 150 milhões
em 30 anos, a serem investidos na Resex do Rio Cautário, por incentivo à
conservação do carbono florestal, lembrando que para todo o Estado se fala em
quase R$ 2 milhões em uma primeira estimativa.
MEMÓRIA VIVA DO CAUTÁRIO
Raimundo, filho de cearense “soldado da borracha”, nasceu perto do rio Pacaás Novos |
Nascido na barranca do rio Pacaás Novos e atualmente com seis filhos e
três netos, Raimundo Pereira Alves é dono de fabulosas histórias na Resex do
Rio Cautário. É casado com dona Maria Delvina Ferreira, 53.
“Com sete anos de idade, meu pai andava comigo pela floresta, e pra cá
eu vim só em 1979”, contou.
Aos 12, ele andava sozinho pelo interior do Seringal São Luiz, “com medo
de onças”. Foi comboieiro de tropas de burros, animais que transportavam as
pelas de borracha. “Hoje, abrem o corredor e levam tudo de moto”.
O pai dele, Raimundo Pereira dos Santos, falecido em 1998, veio aos 18
anos do Ceará, embarcando em navio com 1,5 mil homens (soldados da borracha,
ou arigós) que trocavam a 2ª Guerra Mundial (1939-1945) pelo Acre,
Amazonas, Rondônia, outros foram para a Bolívia, enfrentando a malária e outras
enfermidades para se se dedicarem à extração do látex que o Brasil fornecia a
países aliados.
“Aqui, o transporte da castanha e da borracha era feito de
barco”. Conta ainda que se cansou de ver a esposa trabalhar tanto em casa
e os filhos no roçado do entorno que até desanimou em extrair o látex quando o
preço do quilo caíra para 85 centavos e os mais antigos presenciaram a invasão
da reserva por pescadores e madeireiros: “Detonaram um pouco, e agora, os
fiscais de tudo somos nós mesmos”.
Com o dinheiro da bolsa de R$ 1 mil mensais, estímulo a partir de
contrato do Governo de Rondônia com uma empresa de investimentos e proteção
ambiental para a obtenção de créditos de carbono, Raimundo planeja algumas
melhorias em seu terreno, entre elas, a construção de um defumador.
_____
► Rondônia
possui 30 terras indígenas, 25 reservas extrativistas. No conjunto,
63% são áreas protegidas. A Resex do Rio Cautário está dividida em sete
comunidades: Águas Claras, Canindé, Ilha/Jatobá, Lago Verde, Laranjal, Ouro
Fino e Vitória Régia.
► Entre
30% e 33% são áreas de uso sustentável, terras indígenas e unidades de
conservação. Há uma população de 15 mil pessoas, cuja tradição é pautada no
extrativismo.
► A
importância da retomada dos seringais nativos é tema da professora
Rosalina dos Santos Dias, descendente de extrativistas, que vem estudando o
setor por meio de sua Análise da viabilidade econômica e do projeto de
manejo florestal da Resex Rio Cautário.
► O
Pacto das Águas apóia empreendimentos comunitários no seu
desenvolvimento organizacional, a qualificação da produção.
► Compradores
estrangeiros exigem atualmente borracha limpa de impurezas, geralmente
flores, insetos e sementes. A França já compra, e o Irã também deseja a borracha rondoniense.
* REDD+ é o incentivo desenvolvido no âmbito da
Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima para recompensar
financeiramente países em desenvolvimento por seus resultados de Redução de
Emissões de gases de efeito estufa provenientes do Desmatamento e da Degradação
florestal, considerando o papel da conservação de estoques de carbono
florestal, manejo sustentável de florestas e aumento de estoques de carbono
florestal (+).
Fonte
Texto: Montezuma Cruz
Fotos: Frank Néry
Secom - Governo de Rondônia